Evento sobre Crowdsourcing contou com gerente da NASA e profissionais brasileiros

Eduardo Bertassi. Fonte: CEST-USP

No dia 27 de abril de 2017, na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, ocorreu o primeiro seminário do Centro de Estudos Sociedade e Tecnologia (CEST) sobre crowdsourcing, um modelo de negócios colaborativo utilizado não apenas por grandes empresas como Google, Uber, e Airbnb, Netflix, mas também por startups brasileiras como Kickante e CrowdTest. Organizado pelo pesquisador Eduardo Bertassi, o evento trouxe quatro palestrantes que, a partir de suas visões e experiências, buscaram mostrar os conceitos, entraves e particularidades desse modelo de negócios.

Marina Miranda. Fonte: CEST-USP

Marina Miranda, diretora geral da empresa de consultoria de crowdsourcing Mutopo Brasil, iniciou as apresentações traçando um breve histórico de suas experiências na área: em 2008, participou do projeto Teia MG, que envolvia jovens de regiões pobres do estado no aprendizado coletivo de técnicas de computação. Ela também falou sobre a importância da realização da Campus Party ao introduzir no país a um ambiente de informação descentralizado e hiperconectado que é a base do crowdsourcing.

Ela apontou alguns fatores-chave para a evolução da prática como: a globalização, que ampliou a conectividade e o potencial humano disponível; o advento das redes móveis, que permitiu que o crowdsourcing pudesse ser executado de qualquer lugar usando até mesmo telefones celulares; a mudança nas aspirações de gerações mais novas, que buscam um estilo de vida mais flexível e diversificado, preferindo compartilhar recursos a ter bens particulares.

Por meio de “desafios” propostos na internet por empresas como a Starbucks, o método passou a ser utilizado para permitir que pessoas do mundo inteiro apresentassem não apenas projetos, mas também soluções. “As redes sociais fazem com que as pessoas possam criar projetos” ela disse, mostrando como a evolução no uso da internet — da comunicação privada à cultura do compartilhamento — possibilitou a popularização do crowdfunding e do crowdsourcing. “Essa questão social é muito forte nos seres humanos, é por isso que isso vai crescendo tanto”, comentou.

Marina também chamou atenção para outras formas mais sutis de crowdsourcing que são realizadas pelos prosumers, pessoas que deixaram de ser apenas consumidores de conteúdo da internet para também serem produtores de conteúdo para a internet. Essas pessoas produzem conteúdos que são vendidos ou apenas divulgados por outros sites de forma que ambas as partes envolvidas, os usuários e os donos das plataformas de crowdsourcing, se beneficiam mutuamente. É o caso de empresas como iStockPhoto, Pinterest, Instagram, entre outros.

Daniel Souza. Fonte: CEST-USP

A palestra de Daniel Souza, co-fundador da plataforma dedicada ao investimento em startups Broota (que passou a se chamar Kria em 2018) , abordou o tipo de crowdfunding utilizado em sua empresa: o chamado equity crowdfunding. O modelo se baseia em rodadas de investimento online nas quais empreendedores podem comprar ações de uma empresa em ascensão, formando, assim, uma rede de negócios mais ágil, ampla e acessível. A plataforma permite que o investidor entre em contato com um número maior de startups com maior facilidade.

Daniel também deu uma visão geral do perfil das startups e dos investidores ativos na plataforma: as novas empresas pertencem a uma variedade de segmentos e visam produtos inovadores com alto potencial de crescimento, além de 70% localizar-se em São Paulo. O investidor padrão, por sua vez, é empreendedor, jovem, graduado e, em sua grande maioria, homem. O palestrante também reiterou a necessidade de guiar esse investidor na lógica diferente desse tipo de negócio: como apenas cerca de 20% das startups trazem retorno devido à instabilidade desse mercado, é preferível realizar investimentos menores em uma quantidade maior de projetos.

No primeiro debate, mediado por Thomas Eckshmidt, fundador do Instituto Capitalismo Consciente Brazil, falou-se sobre o crowdsourcing como sendo uma evolução tecnológica de mecanismos que já existiam, como júris populares e pesquisas de opinião, e de uma sociedade moderna caracterizada pelo empreendedorismo.

Robert Pereira. Fonte: CEST-USP

Após breve intervalo, retomaram-se as palestras com a participação de Robert Pereira, fundador das plataformas de crowdtesting Base2 e Crowdtask. O crowdtesting aposta na eficiência de comunidades online para avaliar softwares e jogos eletrônicos e apontar problemas neles. Robert explica que o crowdtesting permite que uma quantidade muito maior de pessoas, com diferentes graus de conhecimento e habilidades, participe da etapa de testes de um sistema. A diversidade das pessoas é fundamental pois permite que casos de teste que nunca seriam imaginados pelos desenvolvedores acabem surgindo, o que permite apurar de forma ainda melhor o sistema sendo desenvolvido.

Além disso, Robert afirma que o modelo de crowdtesting também traz benefícios financeiros por ser menos oneroso às empresas e por acelerar o processo de testes. No entanto, ele explica o porquê deste ainda não ser o principal modelo empregado, “É mais difícil garantir a confidencialidade de um projeto quando se trabalha com grandes comunidades de testadores”. Segundo ele, os testadores avaliam apenas um determinado aspecto do programa e perdem a visão de contexto, sem contar que não se pode garantir que sejam sempre os mesmos testadores trabalhando em um projeto, o que faz com que a busca por testadores bons seja contínua.

Para o futuro, Robert aponta que, no Brasil, ainda é necessário: garantir a qualificação dos testadores (até então, não há nenhum tipo de seleção específica para as pessoas que participam dessas comunidades); implementar novos modelos de pagamento (além do pay-per-bug, que paga por problema identificado no software, e o pay-per-test, que paga por teste executado); e automatizar a curadoria de perfis de testadores para projetos específicos.

Steven N. Rader. Fonte: CEST-USP

O evento teve prosseguimento com a participação via conference call de Steven N. Rader, gerente adjunto do Centro de Excelência em Inovação Colaborativa da NASA. Rader explicou como a NASA vem usando o crowdsourcing para impulsionar a inovação. Ele conta que sabe que nenhuma empresa consegue ter todas as melhores mentes do mundo trabalhando para ela – nem mesmo uma instituição de tanto renome quanto a NASA, por isso, o uso de plataformas de crowdsourcing abrem o contato com diferentes comunidades. Apesar de haver uma curadoria para seleção de participantes, é possível notar que o crowdsourcing permite acessar a expertise e o conhecimento de pessoas de fora da NASA, ou até mesmo de fora do campo de pesquisa sendo trabalhado, trazendo novas perspectivas para uma mesma situação ou problema.

Ele relata que a NASA, através de premiações e concursos online divulgados em plataformas como Topcoder, Innocentive, Grabcad, entre outros, emprega esse recurso na solução de problemas que sua equipes internas demorariam mais tempo para resolver, seja na elaboração de novos algoritmos e softwares ou na criação de designs inovadores. Além disso, eles contam com um programa chamado NASA@Work, que é basicamente uma plataforma de crowdsourcing interna da NASA, que serve para integrar os vários setores de sua equipe em torno de projetos específicos.

Thomas Eckschmidt e Robert Pereira. Fonte: CEST-USP

Num debate final mediado por Thomas Eckschmidt, finalizou-se o seminário. Levantou-se a questão de qual seria o melhor modo de atrair pessoas para contribuir aos projetos de crowdsourcing e, ainda, como atrair essa maior diversidade de pessoas, que é tão enriquecedora. Para Rader, é necessário engajar a comunidade com o desafio, seja por meio da premiação, pelo sentimento de que o projeto está ajudando a sociedade de alguma forma, ou mesmo pela dificuldade do desafio. Quanto à diversidade, depende-se das plataformas existentes para fazer seu papel na divulgação, embora o modo como se descreve a situação-problema também serve para torná-lo mais ou menos abrangente.

 

Para acessar o material do evento (apresentações, fotos e vídeos), clique aqui.

Texto de Fredy Alexandrakis e Bárbara Reis (Jornalismo Júnior da USP)

Revisado por Eduardo Bertassi